Empacotar é coisa do século passado - acordo de cooperação tecnológica
Em seu blog, Ian Murdock, o fundador do Debian nos diz em ‘Como gerenciamento de pacotes mudou tudo‘ que:
Qual é o maior avanço que o Linux trouxe para a indústria ? Essa é uma pergunta interessante, e uma que na minha opinião tem uma resposta simples: Gerenciamento de pacote ou, mais especificamente, a capacidade de instalar e atualizar software através da rede de uma forma transparente, integrada e elegante, juntamente com o modelo distribuído de pacotes. (adaptado)
De fato, é um diferencial ímpar. Mas esta tecnologia do mundo GNU Linux está presa ao século passado. Os programas já compilados que instalamos nas nossas distribuições favoritas são produzidos em um processo artesanal que me remete as antigas linhas de montagem em que cada produto precisava ser manualmente embalado.
Divido aqui a comunidade de software livre em dois grandes tipos: aquela que desenvolve, que está engajada diretamente na produção de software, na programação dele. São projetos como OpenOffice, Gnome, Apache etc. Do outro lado, temos também as comunidades que distribuem esses softwares, que fazem as distribuições como Debian, Ubuntu, Fedora, ArchLinux etc. São grupos bem distintos com culturas bem distintas e integrados pela prática rococó do empacotamento.
Para efeito de conversa, pensemos no Apache, exemplo favorito de Sergio Amadeu. Quando o projeto Apache lança uma nova versão de seu software, ele lança apenas o código fonte. Cada usuário GNU Linux, para utilizá-lo, tem que baixar o código-fonte e prepará-lo para compilar. Tal tarefa não é uma das mais fáceis e exige tomada de decisão baseada em quesitos técnicos. Cada dependência, cada pedacinho que compõe o programa teria que ser separadamente baixado, compilado e configurado manualmente. Para ferramentas grandes como Gnome e KDE isso chega a levar dias. Por isso vou um pouco além de Murdock: eu diria que o GNU Linux seria insalubre se não fossem os sistemas de gerenciamento de pacotes. Tais sistemas permitem a mágica do único comando ou com um punhado de cliques, o Apache seja instalado já previamente compilado e pré-configurado para o uso mais comum.
Mas… como o pacote do Apache ou de qualquer outro software são gerados ? Eis o processo que me dá arrepios: assim que uma nova versão do software é lançada, um voluntário de cada distribuição GNU Linux existente tem que manualmente fazer o download da nova versão do programa, compilá-la, configurá-la e por tudo isso em um pacote, que por si só, o empacotamento não é um processo simples e como a compilação, exige um engajamento em questões técnicas profundas. De fato, é uma otimização. Uma pessoa faz o trabalho sujo uma vez para que as outras milhares possam queimar essas etapas demoradas e chatas.
- Oras Kurt, mas se é tão bom, do que estas reclamando ?
Bem, não posso dizer pelos outros, mas me sinto muito estúpido quando sou obrigado a fazer algo que uma máquina faria muito mais rápido e eficientemente do que eu. Se toda a internet funciona com máquinas independentes, sendo a intervenção humana resumida a alguns Homer Simpsons olhando LEDs piscarem, por que cada singelo software tem que ser manualmente baixado, compilado, configurado e empacotado ? É uma perda de material humano e de tempo.
De fato, a força do Software Livre está em sua construção colaborativa. Mas precisamos depositar força de trabalho naquilo que realmente demanda por um cérebro orgânico. Por que não criamos scripts e softwares que automaticamente criem pacotes para cada distribuição ? Por que precisamos depender de um voluntário para que tenhamos em nossa distribuição favorita um software ? Tal processo ineficiente gera distorções: algumas distribuições tem um pacote e outras não, algumas tem versões mas atuais outras com versões antiquérrimas. Se todos usamos GNU Linux, por que manter em um cenário tão desigual em termos de disponibilidade de software ?
Em vez de cada distribuição criar a cada lançamento de softwares um pacote para ele, basta cada distribuição criar uma única vez um script para empacotar o Apache e a cada nova versão deste software, o script detecta, baixa, compila, configura e põe no repositório devido (por exemplo, os testing ou development).
- Eu já pensei nisso, mas é algo difícil de se fazer…
É difícil porque cada comunidade de desenvolvimento adota padrões diferentes. Tal diversidade atrapalha a construção destes scripts e intrisicamente seu funcionamento. O que venho aqui neste artigo propor de novo é um Acordo de Cooperação Tecnológica (ACT). Se conseguirmos padronizar o modus operandi das comunidades que desenvolvem software livre e das que distribuem, esses scripts funcionariam com tranquilidade. Mas, jamais para criar um padrão único para todas as distribuições e sim acordos de duas partes envolvidas: uma distro e um software combinam um padrão para que o empacotamento possa ser realizado. É a criação de um acordo, uma promessa de se deter a um padrão e não criar um padrão único. Exemplificando: é combinar qual vai ser o uniforme de um colégio e não que todos os colégios do mundo tenham o mesmo uniforme.
Nesse acordo, os projetos de softwares livres que possuem comunidade sólidas, como os que eu mencionei ao longo deste artigo, entrariam em acordo de cooperação com os responsáveis das distribuições que os utiliza ou os distribuem automaticamente instalados (como é o caso do Gnome para Ubuntu) para estabelecer algumas regras, algumas guidelines para o lançamento de novas versões. Onde fica que o arquivo XPTO, como que é a estrutura de XYZ, onde se armazenará o metadata da descrição do programa etc… de forma que:
a) A comunidade que desenvolve o software se compromete a seguir certos padrões no lançamento de seu código fonte, estabelecidos em consenso interno e com as comunidades das distribuições.
b) Cada distribuição assinante do acordo se compromete em desenvolver e manter scripts que façam o empacotamento automático.
- E se o script em algum momento falhar ?
É aí que finalmente deve entrar a força de trabalho humana, lendo os logs do script para detectar o erro, e providenciar a correção dele junto a comunidade que desenvolve o software ou reparando o bug do script para que ele volte a ser autônomo. Também o acordo não iria engessar os desenvolvedores e arrastá-lo para padrões artificiais. Na verdade, ninguém precisa mudar de padrão. Apenas eles precisam ser estabelecidos, listados, fixados, para que os scripts possam ser construídos e funcionarem. Dessa forma, estaremos construindo toda uma cadeia produtiva de lançamento de software livre, caminhando para mais um salto evolutivo nos sistemas operacionais GNU Linux.
UPDATE: Tenho ciência que algumas distribuições mais voltadas para a compilação no ambiente do usuário (como Gentoo e ArchLinux) têm automações parecidas. Não estou aqui sugerindo um processo na relação entre o usuário e o processo de instalação de softwares e sim no processo de empacotamento que a maioria das distribuições Linux fazem entregando ao usuário binários já compilados em forma de pacotes que dependem de intervenção humana. Se observarmos os dados do Distrowatch retirados hoje, temos como distribuições mais populares:
1- PCLinuxOS - RPM
2- Ubuntu - DEB
3- OpenSUSE - RPM
4- Fedora - RPM
5- LinuxMint - DEB
6- Sabayon - Portage
7- Mandriva - RPM
8- Debian - DEB
9- Mepis - DEB
10- Damn Small Linux - DEB
11- CentOS - RPM
Excetuando o Sabayon, todos utilizam essa abordagem manual na criação de pacotes.
- Bitácora de thiago
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